Saturday, February 26, 2011

Mistério

Service. Gravura em técnica mista, Paris 2010.



Para tudo no Universo, o átomo. E para cada entre eles, um espaço, Mistério. O mistério que mora infinitamente em cada centímetro de Vida fora e dentro de mim.


O mistério está por toda parte, nada consegue fugir dele. O mistério dança frenético com o vento ou medita estruturalmente nos caules das arvores. Fico me perguntando como é esse misterio que me habita. Será que partilha como no vento, ou será como nas aguas, partilha dor, amor? Partilha a dança, o choro, o coro? 


Acaba que é do mistério decidir o mover e o organizar dos atomos, partículas. É ele o ordenador de todas as danças, o destruidor de todo o resto, o mantedor da ordem. É ele o grande maestro, o que dita, o que cria. O que junta, agrupa e canta a música a se dançar. Decidindo o espaço que quer pra si. Como um sussuro de ar infinito, um sussuro eterno. Deixando ao freguês o gosto de ser asim, um quê de dupla, um jeitinho dois em um de ser.


Uma cabeça, um corpo e o espaço. Uma cabeça que pensa e perdida [re]viaja no passado, projeta e esculpe no futuro. Caótica deixa o corpo, a casa criada, mantida, destruida e ordenada é pelo mistério. A mente que não pensa no presente, deixa o corpo assim ao léu. Ao Deus dará.


Enquanto viajava eu por entre os vazios que me levavam aos outros, vi o mistério. Ele me deixou vê-lo: um garoto em pé, beira da estrada, a cabeça pensava, voava longe; o corpo sozinho, vivia. E o mistério brincava de bater a mão que segurava o celular no peito, no coração. O mistério fazia chamada, mostrava o caminho. Mas a mente viajava cega, perdida, longe de uma casa misteriosa que começa a se revelar. Eu vi, meu corpo fez click, chave-fechadura. 


E o mistério decidiu que não quer mais ser misterioso...




em 26 de fevereiro de 2011.
Georgia Cardoso

Tuesday, February 8, 2011

Assim quando a saudade é meio sem luz

Técnica mista, Paris Natal 2009




Existe dentro de mim uma saudade que nunca acaba, uma sede que não posso saciar, um desejo, um querer ser, um querer estar. Sinto saudade de quem mora perto, mas se materializa longe. Sinto saudade do tempo em que eu tinha todo o tempo do mundo pra receber. Hoje sou eu que tem que dar. 


Sou eu que tenho que me dar amor, sou eu que tenho que me dar atenção, sou eu que cuido de mim. Que preparo a terra, que aplico a teoria. Assim, sabendo que não se é só, mas reclamando que se é. Porque é inegavel que acabei ficando mimada.


Não me vale lá tanta coisa sentir que tem um céu em cima da casa e um chão embaixo dos pés se eu mesma dentro de mim não me faz tão feliz como quando minha familia que me habitava me fazia irradiar. É a mim de habitar, de tomar posse da terra, do corpo. Mas eu sinto tanta saudade é de te louvar, de te encantar, de te embelezar com flores, frutas e perfumes. De mostrar minha poesia, minha rima. De conferir as medidas e dimensões da luz que sai de mim graças a um mim e ti. Escrever na cuca teus ensinamentos, plantar as sementes dos sonhos que não soube sonhar sozinha, me banhar no teu abraço afetuoso. Ai! Que me maltrata ter esse vazio, que me maltrata não ter nem encontrar nada que possa iluminar com as cores que só tu soube me mostrar.


Agora é outro tempo. É um tempo precioso, inédito. É como estar de férias, com olhos de viajantes, eu sei! É um cuidar de mim, um viver pra mim, um descobrir a mim. Só porque nas ondas dessa vibração assim se faz necessário... Logo eu... Tão apaixonada e amorosa por tudo que por mim passasse, tão entregue e alucinada em dar de mim, eu só existo porque o outro existe antes, porque alguém irradia o amor. E minhas outras partes de mim, me ninam nesse ninar sem fim.


Minha natureza é assim, jogada aos pés de tudo que for Verdadeiro. Aonde se há a Vida e Sentido, eu estou lá, de joelhos, fazendo reverencia. 


Mas nessas ondas é diferente. De nada vale já ser o que se é, se o carro, essa carcaça anda meio defeituosa e mal chega na esquina. Tem que cuidar, trocar os freios e pneus, colocar lampadas novas, melhorar os estofados, vale até mudar a pintura. Enquanto toda a carcaça se repara, a estrada fica lá, parada. Esperando eu me jogar no carro e soltar pelas janelas coisinhas bonitinhas por onde for. Levando as vezes passageiros, parando em algumas partes do caminho pra dançar e girar, assim meio sem rumo mesmo. Indo por onde o vento que já é amigo me mostra a direção. 


E parece até assim, parafraseando o partir e o fim, que lá na frente mudou alguma coisa. Parece que o ciclo mudou mesmo, parece que eu estou crescendo. Parece que a roda já vai girando. O Pai vai virando Amigo, vai virando parceria. Eu toda pronta e equipada, autosustentavel, uma beleza de pessoa. Aberta, cheia de amigos e parceiros, andando por aí, dando em dose multipla tudo que eu nao soube um dia no passado dar sozinha. Dando Muito, dando com força, verdade e vontade. Com flores, fitas, doces e perfumes. Já vi, agora tá tudo ok. Quando o carro tiver bom, a gente pega a estrada. Hum? Posso fazer um carro que voa? Se tiver alguem disponivel afim de ensinar, avisa por aí que aqui tem alguem querendo aprender. 


E agora assumo, encontrei até a humildade e o prazer. Ser mecânico é até bom mesmo. Não precisa ter tanta pressa asim, deixa o Tempo lá naqueles conformes, bem perfeitos. Porque o carrinho tá ruim, mas já tá dando pra passear e aproveitar aqui pelas redondezas. Ir até a praia pegar umas conchas pra enfeitar, tõ guardando a prancha, a bicicleta e os oculos de mergulho nele. As vezes até durmo dentro do carro, como por lá, troco o óleo, limpo ele. Sabe, até que já fiz amizade com os professores dessa área, me ensinaram a ganhar espaço no carro e a ficar na frente. E tem uma parte lá que esquenta que eles estão me explicando melhor como funciona. Tem muitas funções, muita coisa pra aprender. E cada função do carro interage com as belezas manifestadas do lado de fora, mexe com os carros que passam, com o povo que atravessa, com o latido do cachorro. Vamo sem pressa, eu consegui captar, tá uma beleza mesmo que seja longe de voces. Saudades.


por 
Georgia Cardoso
em 8.2.2011