EU EM MIM
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Inspiração, Acrílico sobre tela, 2012 |
Pelas palavras eu penso em deixar fluir aquilo que através da
razão eu não consigo penetrar e partir em mergulho profundo em regiões obscuras
não por serem más ou desprovidas de beleza, mas por serem ocultas,
misteriosas. Lugares até então
desconhecidos, esquecidos. Histórias que ficam guardadas no mais profundo dos
baús do inconsciente esperando a hora certa de serem recolhidos e iluminados
por velas em castiçais dourados. Revelados. Elevados.
Escondidos tesouros, profundamente enraizados. Esperando a
hora a se revelar. Esperando o momento a retornar. E virem à tona, à superfície.
Voltar a ser gente, reutilizar-se. Compartilhar desta beleza, até então tão bem
ocultada. Por não haver sido tocada, por até então não haver sido requisitada.
E dentro de todas as infinitas horas, vem o seu momento,
feito reencontro profundo. Eu e Terra. Como se pudesse ser e sentir a seiva das
entranhas do solo subir pelas raízes, percorrer uma estrutura e nutrir frutos
que maturam e que se aquecem. Novos nutrientes para frutas novas, mais
formosas, saborosas. Daquelas que o sumo escorre pela boca e volta a batizar a
terra enlouquecendo os sentidos, enchendo a boca de sabor, nos olhos, na pele.
Até parece que um código profundo foi realinhado,
reacordado. Um novo jeito de colher as coisas e puxar da terra energias
diferentes: sumos, valores, nutrientes. Para modelar a terra num agora tão
diferente em momentos que poderiam até passar despercebidos, não fosse a
sensação inebriante que as frutas suculentas provocam em minha boca, em minha língua.
Atiçando-me para sugar e ser esta seiva que percorre meu corpo com fervor. Sangue
que me percorre com ar, com nutriente, com substância. E vir a ser gozo
tranquilo a percorrer as entranhas incessante, alimentando de satisfação meu
corpo, meu ego, meu conforto.
Esparramando minha existência em mim mesma, de tanta paixão e alegria envolvidos
que acabo sendo quem eu sou.
Da posse tão rara da minha terra, vejo logo lá que já não é
mais só a mente minha morada, pois começo sutil e sorrateira a me adentrar e
fazer do cálice de terra construção simples e arejada; compactada. Eu me sinto.
Eu sou minha. E por mais que não possua-me assim tão inteiramente, já aprendo a
percorrer-me em minhas veias. Eu sou meu sangue. E corro por entre mim, e levo o
ar. Eu me alimento. Eu sou meu corpo. E me excito diante de tanta tranquilidade
como um passarinho que se prepara para pousar e viver uma nova história.
Eu existo em mim e até seria complicado de entender se não houvessem
passarinhos tranquilos mergulhados em uma imensidão interior profunda guiados
por algo inexplicável quando decolam de um galho a outro. Assim tão
naturalmente como um coração que bate. Coisas
que simplesmente são.
Átomos que se agrupam e se reagrupam aqui e ali com outras
coisas. Galho e passarinho, eu em mim. São interações, composições e melodias.
Eu e corpo; sinfonia composta. Por mais que (en)cante em momentos abreviados
correndo em veias, carregando ares, nutrindo... Ou voando em sinapses, pulsando
em corações como um tambor que nunca pára de tocar.
Serei em mim, o tesouro revelado. O baú aberto, iluminado. Me
reconhecerei e aprenderei a ser em mim o que ainda desconheço. Coisas novas e
diferentes que iluminam o teatro do meu corpo, tão complexo, este Universo que
ainda inteiro pulsa condensado. Tudo que se representa em mim, em micro, multifacetado.
Nesta terra hei de pousar para ver-me conquistando cada pedaço e vestida de desbravadora,
consquistarei a mim e serei em mim. Para que eu possa feliz te mostrar um dia,
o movimento do brilho das estrelas quando eu dançar.