Monday, November 28, 2016

Coração Poroso


A maleabilidade que me atinge
Já não tira mais o meu espaço
Ser em si feito barro moldável
Não mais nas mãos de quem me manipula
Já me perdi em muitas inspirações estrangeiras
Hoje sou apenas um coração poroso
Que quase tudo pode perpassar
Vivo em minha mente uma matemática irracional
Não calculo e simplesmente deixo fluir
Ampliado espaço interno de ser o que se é
Não anula o brilho de ninguém
A contramão do óbvio
Tece curvas de compaixão
Quão mais o coração se abre
Menos me perco de mim
Quão mais me expando em ser quem eu sou
Mais gente cabe dentro de si
É meu auto-amor que não pára de quebrar as barreiras que habitam aqui
Georgia, 2016

Saturday, November 26, 2016

O retorno da mulher-da-caverna


Eu quero rezar por tantas coisas
Minhas pisadas caminham em tom de oração
Coisas complicadas que só a fé pode ajeitar
Piso nas folhas secas aliviada
Despoetizando algumas delas
Porque não lido bem com o excesso de revelações
Nem com olhos de gavião sobrevoando meu jardim
Sei que o excesso de mistério me faz viver em eterna economia
Vivo com tão pouco, eu sei
Mas deixar de compartilhar o dom
É muito pior do que viver apenas em meditação
O excesso de inaniçao agora já me bambeia
Deixar todo o espaço pra expressão do outro
Não me satisfaz mais no coração
Escondida com as corujas na mata
Encontrei refúgio seguro diante da destruição
Por mais que minha adaga corte selvagemente o que é desqualificado
Sua navalha de tão velha já está cansada
Talvez seja preciso furar o tempo
Abandonando a tão útil adaga mortificante
Livrando meu peito de uma implosão que me aterroriza dia após dia
Sei que não lido bem com holofotes
Escondida na caverna sempre achei que era lá meu melhor lugar
Mas algo que é além de mim me tira dessa condição
E acredita por algum motivo que na claridade cumprirei melhor minha missão
Georgia, 2016

Diário de uma primitiva


Dentro da cova nunca fiquei em hibernação
A vida contida na meditação é infinita
O Deus da exuberância nunca precisou de forma alguma pra me seduzir
A primavera me empurra pra fora da cova
Lá fora não há tantas belezas como dentro da caverna
Guardo os tesouros velados em meu peito e sigo mundo afora
Já não preciso mais me deixar levar pelo vento
Seguindo os rastros que seduzem minha utilidade
Hoje escrevo uma nova história
E não sou mais sem terra ou sem civilização
Há morada do lado de fora
E me vejo derramada em sensibilidades incessantes
Poderia abraçar todas as fragilidades do mundo
E viver por elas a estrutura que encontrei em mim
Mas já não tenho mais dúvida que algo está além de mim
Pois alguns me guiam de maneira pertinente
Uma paciência serena me coloca em plena observação
Não preciso ter pressa para definir qualquer direção
O método que acolhe esse excesso de maternidades
Remodela-se dentro de mim
Não preciso oferecer minha vida ao outro
Como na caverna pude sem exitar entregar-me ao Sol
É preciso mensurar em si uma matemática divina
Aonde a equivalência da entrega seja proporcional a cada centelha que cruza
A potência que até então era completa
Não precisa mais devorar os filhos como uma forma de reencarná-los
Ainda não sei pisar no mundo dos civilizados
Minha natureza é bruta demais para relacionar-se com os carros e as construções
Tudo isso é inevitável depois de tanta chuva que rolou
Uma tromba d'água se anuncia em meu coração
Felizmente há em mim um velho que caminha sem pressa
E feito melodia que se compõe
Acompanho cada acorde de uma nova canção
E na transcendência dessa melodia
Sinto uma leve brisa cantarolando em meu futuro
Equilibrando em minha consciência a potência que se desenrola sob meus pés
Georgia, 2016

Poesia perdida n.indefinido (2014)


Cura que em tudo está
Falai por mim
Por obséquio
Seja em mim a fonte
De toda tua possibilidade
Encanta dentro de mim tudo que está por vir
Fonte de Deus
Criatividade transcendente
Noite sem perigo
Cheiro de mata
Coragem pra seguir em frente
Choro de libertação
Recomeçar todos os dias
Todos os instantes
Ser lua nova me faz curar
Georgia

Oração ao vácuo

Todas as indefinições
Entre intuições e ilusões
Me deixam ajoelhada pedindo mais tempo
Para que me chegue a sanidade necessária
De ser inteira mais uma vez
Catando porções perdidas no espaço
E sensações d'outros momentos que estão aquém do meu agora
Meu precioso vácuo clama pela minha inteireza
Não há felicidade na fragmentação
Preciso viver em mim o máximo de concentração
Magnetismo que só o vácuo é capaz de sugar
Tudo que me pertence eu chamo de volta
Ao meu direito que é irrevogável
Confio em mim e em todo meu legado
Não tenho vergonha de pedir de volta
Há ciclos que findam
Há amores que precisam ir embora
Mas o que me pertence é território meu
Meus apegos me conduzem para minha melhor hora
Só assim estarei honrando a minha verdadeira história

Georgia, 2016

Sunday, November 20, 2016

Estrelas e esquinas

Sonhar não é eterna perda de Tempo
Cada Tempo mora em Si
Intercalados em suas nuances
Sinto falta do meu Tempo intercalado
Queria dele fazer uma grande casa
Meu peito aberto em alegrias
Caminhantes do céu reinando em seus corações
Um lugar distante cravado nas estrelas
Aonde a alegria é passaporte sem fim
Reconheço e aceito os esbravejantes
Caminham em ruelas e becos em busca de soluções
Por mais que o céu seja caminho aberto
Há quem prefira
Em seu tempo de buzinas
Contar as curvas entre as esquinas
Mas aonde cohabitam estrelas e buzinas?
Um imensidão sem fim se desenha
O senhor dos caminhos em mim nos possibilita
Um pé mora no céu e o outro na viela das cidadezinhas
Cada um cuida do que é especialista
Assim a gente faz da nossa gente um verdadeiro balaio
Eu te dou o brilho das estrelas
e você me dá o desenrolo de suas esquinas
De algum jeito eu aprendo a vibrar em seu mundo
E você também sem se perder vem vibrar no meu


Coração livre


Meu coração é eterna oferenda
Chaves desatinadas se perderam por aí
Logo pois é porta escancarada
Sem chave ou fechadura
Sinfonia incessante
Perdoe-me a falta de submissão
Mas a rebeldia não nasceu em mim sem causa
Quero sempre mais dessa vibração
Uma oitava acima é o sentido da minha missão
Por isso rajadas de vento se encandeiam do meu peito
Um eterno ir e vir sempre com um só destino
Chegadas e partidas se entrelaçam num endereço só
És o porto do meu peito
Eternamente desembargado
Aonde livremente repousa assentado
Na realeza de um fortuna sem medida
Trono que não se empenha em custos
Essência que não coleciona sacrifícios
E se alimenta desse amado sabor
Para ancorar tudo de mais belo que coexiste em mim
Georgia, 2016

Eu em meio

Tenho mania de caçar incoerências
Uma medida sem fim para aparar hipocrisias
Mas na mata também sou caça
E no meio das minhas buscas
Me encontram belezas que me fazem fluir
Eu fui seduzida por essa verdade
O encantamento revela minha imensidão
Abre portais para minha auto observação
Vejo pelos olhos do mundo alguem que devo ser
As coisas nunca são apenas coisas
São parte e extensão dessa relação em mim
Assim como ao outro dou o mesmo direito
E o outro não é quem acho que é
É extensão de mim
É continuação de tudo que ele cria relação ao seu redor
A forma não me encerra
Nem encerra os que me rodeiam
Vivo a todo tempo buscando captar
Um pouco mais da relação de cada um com o meio
Eu em meios
Caminho do meio
Com menos devaneios
Equilíbrio curador que se encanta no Tempo

O deus dos miseráveis

Eu não quero mais assentar em mim o alívio para minha dor
Todos os dias espero o Sol nascer
Pra dentro de mim, aí sim!
Fazê-lo meu altar
Não acredito num Deus que convoca os miseráveis
Nem num Senhor que busca servos para confirmar sua hegemonia
Deus meu amigo, é para mim um velho camarada
E na festa da sua divindade
Eu sou a alegria que comemora sua exuberância
Eu não quero chorar pelo amor de ninguém
Essa não é minha religação
O amor já nasceu em mim antes mesmo d'Eu perceber
Não quero migalhas de nada que eu já tenha em mim
Mas respeito os miseráveis
Que atrás de tanto luxo, piração e fantasia
Escondem sua verdadeira dor
Mazela intermitente
De quem muito se camufla para ser amado
Ferida inflamada
De quem rebaixa os outros pra se sentir capacitado
Pus infectado
De quem odeia a luz e a alegria do seu ser amado
E é por ir tão fundo nessa percepção
Que nunca me falta a bendita compaixão
Mesmo que a esperança da transformação não me acalente
Todo doente merece uma mãe que o amamente
E no silêncio dessa troca conceber a nutrição
Ao acompanhar a dor que sempre caminhou tão só
E segurar a mão em tom de confirmação
Não há mais solidão quando alguém percebe tão doída inadequação
Georgia, 2016

Espaço criativo


Na vida quase tudo é espaço
Espaço que graças a Deus é relativo
E a criatividade foi a ferramenta que achei para usá-lo
Quero sempre um melhor lugar pra cada pensamento
Quero reposicionar minhas intenções
Num espaço dentro de mim aonde eu esteja mais próxima de quem eu devo ser
Me desmotivam idéias limitantes
Ou cabeças que só funcionam no sim e no não
Limpei a casa pra restaurar esse poder
A magia de viver
Todos os dias em mim clamando por seu lugar
Reorganizar
Reposicionar
Cada coisa no mais sublime encaixe
Existem infinitas possibilidades pra uma idéia se posicionar
Não tenho pressa
Nem nada é definido
É constante lapidação em busca do seu melhor lugar
Georgia, 2016

Caminho

É bem no fundo das entranhas
aonde a razão não consegue atrapalhar
que habitam as placas e indicações
daqueles sinais
que ainda dão a direção
Para poder então galopar seguindo rastros
em inefável beleza selvagem
Levando brasas e brasões
Até reencontrar faíscas de fogo
fogueiras da alma
lavas sob superfícies terrosas
pedras que viram chão
Para vermos juntos então o consumar
não mais da tua quimera, capelas...
mas o começo do que já havia de ter sido
daquele velho tratado
ha mil milênios carimbado
meu dna lá assinalado
amarrado em emaranhados
do qual o fio no peito impregnado
me conduz em sutilezas incansáveis
sempre assim...
Pro fluxo ritmado do meu caminho

Transições Poéticas


De que me vale tanta coincidência
Se efetivamente não me desperta sua utilidade
Não me carece perder mais tempo
Impregnada em sincronias
Que nunca vingarão em meu jardim
De que vale colocar meu prazer
Impregnado em emaranhados
Que nunca desatarão seus nós
Perdoe-me a falta de expectativa
Mas não acredito em promessas sem vida
Nem em potros de cavalaria
Reconheço apenas os bichos silvestres
Que na sua liberdade desmedida
Me acenam novas possibilidades
Pra coisas que eu se quer imaginaria
Georgia, 2016

Monday, November 14, 2016

Ninho Eternal

Ninho Eternal
"Dentro do meu ser eu sou um ninho
Vivo aconchegada na imensidão do meu ser
Ninho esse que ultrapassa as barreiras do que os olhos vêem
É do tamanho das minhas possibilidades de viver
Infinito ninho dourado
Espaço sem fim para vibrações afins
Zelo por ti para que aconchegue apenas o que me faz ser como você
Lugar em ti não falta para as preciosidades
Não apenas porque és meu bem mais amado
Mas porque carrega o dom de guardar tesouros
Meus preciosos apegos em ti estão imaculados
A babagem sincera de um espírito infinitamente rico
Pedras preciosas lapidas pelo Tempo
Raridades doadas pela Eternidade
O brilho dessas jóias reluz a qualquer distância
Sempre sei o caminho de volta à casa
Pois meu peito é céu aberto
Pista de pouso para tudo que no Tempo se eterniza"
Georgia, 2016

Revelação das Águas

Revelação das Águas
Já me fazia falta o meu bonito transbordar das águas
Amor já estava aqui conformado na minha cara
Virara até um certo equilíbrio que nada transpassava
Até esse instante de estarmos de mãos dadas
E assim percebo minha luz que também está em todos nós
Somos todos filhos do mesmo Deus
Oh Senhor, Mestre, Mãe e Pai
Minha irmandade em meu entorno comigo está
Em cada rosto vejo a tua face a centilar
Ser tua filha é bom já que em família estou
Amada humanidade em meio a tanta dor
Ainda somos os amados filhos da Luz que aqui raiou
Somos o mesmo Filho que brota do ventre de nosso Deus
Cada um ensaia a sua direção
Em um arco íris que não é dessa dimensão
Dos seios fartos não faltarão nossa nutrição
Amada Mãe
Generoso Pai
Abram as portas pra termos uma melhor percepção
Somos irmãos
Temos o Pão
Nossa redenção!"
Georgia, 2016

Mar é ponte

Mar é ponte
Que me une a cada um
Às vezes ponte distante
Quase não vejo do outro lado
Gente é ponte
Que me aproxima dos transeuntes
Amores emprestados
Facilitando os outros encontrar
Tudo nos serve
Tudo nos aproxima
Tudo nos distancia
Mas não existe mais distância quando se há uma ponte
O mar sempre está lá

Aprendiz eterna

Do muito nada que sei fazer
Inabilidade não me encerra
Aprendiz eterna me completa
De cada poro minha arte dança
Escrevo, ouço e canto
Minha metonímia é linguagem particular
Rezar traduz o que não sei compartilhar
Sem essa vazão meu peito me espera
Saudade maior é a que tenho de ser eu mesma
Meu ser diluído em cada viver em nós

Ser-inexistente

Ser-inexistente
"A transparência de uma existência
Não anula a verdade de seus sentimentos
Ser-transparente caminha na sua polaridade
Vento que o olho não vê
Para qualquer lente se faz ser inexistente
Vento que a pele sente o carinho
Existência inexplicavelmente sentida
Caminha o ar em todos os cantos
Feliz por abraçar
Polarizado, também é triste por inexistir
Tudo que se pode perceber é apenas fruto do efeito
E só assim se comprova sua existência
Ser-existente compadece de suas incompreensões
Ser-existente vai além de toda causa
Ser-existente se reconhece no sabor do fruto
Fruto doce que não toca seus lábios
Mas feliz faz quem dele se saboreia
Felicidade que se completa na saciedade do outro
E a solidão não é sina quando se há efeitos
A transparência abraça o balançar das folhas
O inexistente abraça o vai e vem das ondas
E ecoa canção suave nos ouvidos de quem ainda tem dúvida
Ar que não se perde
Apenas se espalha
Por todos os cantos, poros, buracos
Extremamente penetrável em sua inexistência
Há que se viver em todos os lugares
Dentro, fora e na imensidão de tudo que é Ser
Ser-inexistente cabe em todos os lugares"
Geórgia, 2016

Ser-transparente

Ser-transparente
"A água, eterna criatura transparente
A ela eu sei que nada pertence
O outro apenas vê seu próprio fundo revelado
Ficando a água bonita pelo que preenche
Continua ela de toda forma um ser transparente
A beleza dela que é apenas aquela que está na gente
Sem nenhuma imagem que lhe represente
Assim é a liberdade de Ser-transparente
Apenas inunda o tempo de quem ela preenche
Fazendo a terra se embalar nas águas
Ritmo suave, uma cadência perene
Preenchida por um ser-transparente
Conteúdo acalma o desejo da mente
Sendo ser água algo transcendente
Não dá pra vê-la, ela é transparente"
Georgia, 2016

Tempo da Lembrança

Tempo da lembrança
O carinho que sinto é inegável
Minha infinita saudade foi embora
E sinto um certo orgulho por tudo que já vivi
Cenas distantes permeiam um passado que já não é mais meu
Um verde bonito vem da flecha do que ja caçei
E apenas resta a lembrança do sabor que me matou a fome
O passado não é página virada
Muito menos página rasgada
É fotografia de um Tempo que já se foi
E a experiência observada da minha luneta
Revigora meu futuro
Se lá trás foi tão bom
Sinto incomparável força pra seguir em frente
O futuro me acaricia com as sementes que florescerão
Adiante
Si
Georgia, 2016

Experimentos Existenciais

Experimentos existenciais
Eu que não me contento com o que os olhos veem
Construí minha realidade dentro dos meus sonhos
Algumas telas estão inacabadas
Muitas outras vivem por fazer
Duvido profundamente que eu só esteja aonde posso tocar
Não me encerro aonde meu corpo insiste em ficar
Devo ser alguém diluído
Minha alma está aonde minha memória brotar
Não existe separação quando a lembrança me acionar
A falta que me movimenta mora no desejo e na vontade de poder sentir
Por isso continuo pintando
E a eterna construção é a sina do meu ser mulher
Minha condição humana ativa o dom da gravidade
Eu sei e aceito que as nuvens jamais descerão
Mas o calor da minha existência proclama alguma combustão
Os pingos da chuva assim me acalmam
Me abraçam e fazem essa conexão
Tornando de alguma maneira minha existência real
E o sonho mesmo distante abençoa este território
Que não mais se deixa existir em vão
Algo em mim, assim, sempre vai vingar
Georgia, 2016

Reflexão da Palavra

Reflexão da palavra
"Nem tudo que busquei no outro me trouxe de volta a mim
Duvido muitas vezes das misturas sinceras
Porque palavras soltas no ar não me cativam de verdade
Mas algo em mim sempre me inquieta
Sinto-me tantas vezes meio alquimista
E guardo palavras soltas para eterna observação
Sinto-me eternamente paciente com as palavras
Não descarto frases ditas
Nem discursos proferidos
Não gravo verdades absolutas
Pois essa função das palavras já não me veste mais
Mas as guardo por tempo indeterminado dentro de mim
Não me preocupo com razões geométricas nem lógicas materiais
Palavras são substrato
Composto perfeito para infinitas experimentações
Tudo que a mim foi dito de alguma maneira será experimentado
E surpreende-me frases sem efeito gerando alquimias
Alegra-me incoerências materiais ganhando consistência pelas palavras
Faz-me duvidar menos
Permite-me acreditar mais
O bendito ouro dessa alquimia
Não mora nos resultados imediatistas
Confiar no outro
Confiar na vida
Pode para a minha racionalidade me deixar meio louca
Mas algo dentro de mim percebe o poder da vida
Esse danado poder do verbo
Essas benditas palavras proferidas"
Georgia, 2016

Nutricao do Alivio

Nutrição do Alívio
Minhas extremas incertezas jamais me tiraram do que é cativo
O dom da dúvida me liberta do que se alimenta do incoerente
O alimento indevido tem hora e prazo pra acabar
Me abasteço de uma nova colheita
Minhas benditas dúvidas me salvaram do veneno inconveniente
Meu jejum foi habilmente necessário para minha sobrevivência
Agora reajo com uma fome genuína
Daquilo que é possivelmente salutar pro meu desabrochar
Apesar da fome que senti
Meu corpo nunca deixou de agir
Minha mente nunca deixou de capturar meus sonhos
Se a injustiça é pedra que rolou no meu passado
Meu pranto aflito não me tirou em nenhum momento de mim mesma
Sou verdade rebelada
Fina navalha inconformada
Meu mundo não mora aonde estão meus pés
Mas minha sina está aonde eu decidir pousar
Cravarei em mim o reflexo do clã que me guarda no seu cintilar
Não preciso de espaços de honrarias
Mas compreendo que se não fosse minha rebeldia
Realmente neste mundo eu não pisaria
(Georgia, 2016)

Desabafos alternativos

Eu passei minha vida toda na contramão do sistema e até hoje em dia, com trinta anos, continuo sendo rechaçada e sofrendo diversos tipos de preconceito. Muitas pessoas não entendem nem apoiam minhas escolhas de vida. Sempre fui considerada a rebelde, anarquista, hiponga, perdida. Minhas escolhas estão muito mais pautadas em meu bem-estar e o bem-estar do planeta do que em uma busca ideológica ou motivos financeiros ou expectativas moralistas sociais. Tenho hábitos vegetarianos porque minha saúde agradece, não compro roupa nova porque o que tenho é o suficiente e excedente vira lixo, faço coleta seletiva porque o lixo que produzimos vai acabar com o planeta, moro numa cidade pequena porque aqui eu posso ter qualidade de vida, sou terapeuta holística e pintora porque assim desenvolvo meu potencial interior, deixo o carro na garagem e vou de bicicleta porque o planeta e minha saúde agradece, moro com outras pessoas porque eu sou um bicho que vive em bando e não isolado em caixa de concreto. Pra quem nunca teve coragem de caminhar na contramão, acho que chegou a hora da ousadia pra todos. O mundo está acabando!!!!!!

O Valor da Liberdade

O valor da liberdade
Andar por aí não me serve pra espairecer
É viajando que aposto minhas migalhas no meu melhoramento
Eu digo que são migalhas
Porque quase nada me custa cuidar de mim
Sou ser precioso
Não existe esforço grande
Nem fortuna exorbitante
Tudo que invisto em mim vale pouco demais
É por isso que nunca me falta nada
Sempre me sobrarão infinitas outras migalhas
Eu não sou uma pessoa custosa
Não sou alguém que valha esforço
Meu desabrochar não vale sacrifício
Vale só algumas moedinhas
Que pra mim não valem quase nada
Porque nenhum investimento se compara ao tamanho da minha alma
E eu não tenho esse dinheiro todo
Essa caríssima alma transborda nessa renovação
Me sinto tão profundamente aliviada
Cada dia um peso a menos a carregar
Cada dia meu Sol amanhece mais dourado
Pois ganhei o direito de ser quem eu sou
E as armas de uma vida inteira vão caindo no chão
Meu horizonte brilha mais claro
A guerra se desenha num passado miserável
Quando percebi o racismo, voltei a ser índia
Quando percebi o machismo, voltei a ser mulher
Quando percebi o capitalismo, voltei a ser cigana
E apesar de toda minha enfermidade
A roda da minha carroça em nenhum momento se estacionou
E o clã que me guarda jamais me abandonou
A liberdade me fez sadia
E hoje carrego na bagagem o valioso sorriso da minha aceitação
Ser livre não custa nada
(Georgia, 2016)